“Não deves depender de ninguém!”

Numa época onde impera o individualismo somos levados a pensar que depender dos outros é errado. É-nos incutida a ideia de que para sermos adultos funcionais e independentes devemos rejeitar a necessidade que sentimos do outro – devemos definir-nos e agir de forma independente.

No imaginário coletivo, a palavra “dependência” costuma carregar uma conotação negativa — algo que se deve evitar para garantir a autonomia e a liberdade individual, sendo por vezes interpretado como um sinal de fraqueza e algo que deve ser desencorajado.

Mas a verdade não podia estar mais longe destas afirmações.

A realidade é que a evolução e desenvolvimento da humanidade tem por base a necessidade que sentimos dos outros. A vinculação com o outro é a estratégia de sobrevivência mais intrínseca do ser humano. A capacidade de depender dos outros é, não só natural, como essencial para o desenvolvimento emocional saudável.

Este princípio, que pode ser descrito como dependência construtiva, tem implicações profundas na forma como nos relacionamos ao longo da vida — sobretudo nas relações amorosas. Construir uma dependência construtiva com o outro envolve cultivar vínculos seguros, recíprocos e saudáveis, onde há espaço tanto para a proximidade emocional como para a autonomia individual.

É um equilíbrio entre confiar no outro e manter a própria individualidade.

Refere-se à capacidade saudável de depender dos outros quando necessário, especialmente em momentos de stress, dor ou insegurança. Ao contrário de uma dependência excessiva, marcada por medo do abandono, submissão ou controlo, a dependência construtiva baseia-se numa relação de confiança mútua, comunicação aberta e interdependência saudável.

Quando estamos preocupados ou em sofrimento, é necessário e natural a procura do conforto no outro. Quando o sofrimento é atendido pelo outro e aliviado é criada uma sensação de segurança que nos permite funcionar autonomamente. A sensação de poder depender de um ente querido cria uma base segura – uma plataforma a partir da qual se pode sair para o mundo, correr riscos, explorar e desenvolver um sentido de competência e autonomia.

Este tipo de dependência torna-se então uma fonte de força e resiliência, um recurso que nos permite prosperar num mundo incerto. Os parceiros de relações que são sensíveis e recetivos a este comportamento acabam por promover independência e autossuficiência, ao invés de inibir.

Nas relações amorosas, a dependência construtiva manifesta-se quando ambos os parceiros conseguem:

  • Apoiar-se mutuamente em momentos de vulnerabilidade;
  • Pedir ajuda sem receio de julgamento;
  • Estar disponíveis emocionalmente um para o outro;
  • Respeitar a individualidade dentro da conexão íntima.

Por outro lado, a negação da necessidade de uma ligação de apoio é um impedimento ao crescimento e à adaptação, e não uma força. Parceiros que são inseguros ou inconsistentes tendem a encorajar a dependência ansiosa nos seus parceiros. Esta dependência ansiosa pode ser caracterizada por medo constante de abandono, procura excessiva de proximidade, ciúmes e insegurança.

Como cultivar uma dependência construtiva com um parceiro?

Construir uma relação amorosa baseada na dependência construtiva exige consciência emocional, diálogo e segurança relacional. Algumas práticas importantes incluem:

  • Reconhecer as próprias necessidades emocionais sem vergonha ou autocrítica;
  • Comunicar vulnerabilidades com clareza e confiança;
  • Oferecer suporte ao parceiro sem assumir um papel de “salvador” ou “mártir”;
  • Promover um ambiente relacional seguro, onde ambos se sentem aceites como são.

Vínculos afetivos seguros são fundamentais para o desenvolvimento psicológico saudável.

Longe de ser um sinal de fraqueza, a dependência construtiva é um pilar da saúde emocional e relacional. Não deve ser desencorajada nem menosprezada, mas sim aceite como parte intrínseca da natureza humana e reconhecida pelo papel que desempenha na promoção de relações saudáveis.

Depender é humano — e amar é também saber acolher essa humanidade no outro.

Deixe um comentário